Dia 20 de Maio de 2009, quarta-feira. Cursava a 8ª série, com meus 14 anos problemáticos em matemática. Provavelmente em minha turma, falaram do jogo que sem querer eu acabaria assistindo. Eu nunca liguei para futebol, exceto os jogos da seleção que eu via só na Copa do Mundo. Parece que é dever de todo brasileiro assistir aos jogos da seleção. Eu cumpria minha parte do contrato canarinho – pelo menos nos mundiais.
Uma quarta-feira normal, se não fosse pela surpresa que teria que mudaria minha vida, de segunda a segunda. Havia aula na quinta-feira, mas por algum motivo – que me falha a memória – não fui dormir cedo como de costume. Por volta das 23h30 desse dia, passei em frente ao quarto do meu irmão, Alexandre. Seguia rumo ao banheiro, mas ele desviou meu caminho ao gritar, desesperado: “Jéssica, senta aqui e me ajuda a torcer pro Inter fazer um gol”. Olhei para ele, confusa e pensei: “Torcer pra quem?”.
De nada mais me lembro da conversa. Só sei que me sentei ao lado de meu irmão – fanático torcedor do Internacional de Porto Alegre – e comecei a assistir os 15 minutos finais do jogo entre Inter e Flamengo, pelas quartas de finais da Copa do Brasil, no estádio Beira-Rio. Meu irmão apenas tinha dito que o tal Inter tinha que fazer um gol de qualquer jeito.
Fiquei ali ao lado dele, assistindo à sua aflição e sua crença.
Num relance, observei o que a TV mostrava com tamanha precisão – um estádio lotado, explodindo torcedores trajados de vermelho cantando sem parar. Não sei o que pensei. Olhei para o lado e ali estava meu aflito irmão vestido de vermelho e branco. Sim, ele fazia parte daquilo tudo. De repente ele gritou: “Falta!”. Não foi um grito comum e sim um grito desesperadamente forte e necessário, como se meu irmão sofresse uma angustiante e dolorosa espera. Juntou as mãos e rezou baixinho: “É agora, é agora”. Olhei para a TV e ao fundo todos torcedores repetiam o gesto. Pensei comigo: “Isso é torcer?”. Não, aquilo era acreditar.
O encarregado de bater a falta era Andrezinho. Acredito que enquanto ele se preparava, o estádio ficava mais silencioso. Quando enfim, ele cobrou e a bola começou a flutuar, o Beira-Rio se calou completamente. Era a última chance de o tal gol sair. E lá no ângulo, ela, bola, linda e redonda foi entrar, fazendo um Beira-Rio explodir pela sofrida espera. Era gol. O gol da classificação.
Meu irmão gritava, pulava, chegou até a beijar a tela da TV. Soltei um sorriso. Dentro de mim, naquele instante, brotava – verde como grama de estádio – um sentimento. Surgia em meu coração a inexplicável paixão pelo futebol. Gritei e vibrei junto. Abracei meu irmão, que dizia sem parar: “Eu sabia, eu sabia!”. O Beira-Rio em coro começou a cantar para o mundo sua alegria. Se meu irmão sabia, eu não fazia ideia de nada ali.
Fim de jogo. Minha mãe querendo dormir, foi no quarto onde estávamos e se espantou ao me ver acordada à meia-noite. Ela me olhou intrigada e disse: “Você está vendo jogo?”. Não sei o que respondi a ela. Sei que aquilo era tudo, menos um jogo comum.
Fui dormir com uma sensação extremamente diferente. Não sabia definir. Ao deitar minha cabeça no travesseiro eu estava… Feliz! O sorriso em meu rosto era a prova da magia do futebol – é única.
Tempos depois me questionaram sobre o time pelo qual eu torcia. Pensei no vermelho que via ao olhar para o céu depois daquele gol de Andrezinho. Respondi: “Eu torço pelo Inter… é para o Inter”.
Aos poucos, ganhei um sobrenome novo. Não era mais ‘Jéssica Loures’ e sim ‘Jéssica Colorada’. O vermelho e branco tomava conta da minha vida. Meus domingos jamais seriam como antes. Acostumaria-me a dormir à meia-noite todas as quartas ou quintas e ao deitar a cabeça no travesseiro eu estaria sempre feliz.
A cada jogo que passava, eu aprendia e me encantava cada vez mais. Meu irmão, Alexandre, diz que eu sou assim, torcedora fanática, por culpa de Andrezinho. E como sou grata ao meu irmão e a Andrezinho!
Hoje sou jornalista e desejo seguir a área esportiva. Tudo isso por causa do Inter. Criei o blog em 2010 para falar do Inter. E nunca mais parei.
Imagine agora se meu irmão não tivesse me chamado naquele dia. Imagine se eu não tivesse ido a seu encontro e sentado a seu lado. Bom, eu não estaria contando essa história. Não estaria mesmo, pois sei que não haveria outro momento para aquilo acontecer.
Posso dizer que aquele jogo mudou completamente a minha vida. Mesmo morando longe de Porto Alegre, meu coração lá está, sempre ao lado daqueles que admiro com uma intensidade inimaginável. Com o futebol aprendo coisas que levarei para toda a vida. Com o Inter é impossível não ser feliz.
Na mesma proporção que eu sorri eu chorei, e é assim até hoje. Nunca imaginei ser tão forte e intenso. Jamais pensei que seria tão apaixonada por futebol. E toda essa paixão incondicional já dura oito. Já vivi muitos altos e baixos, e mesmo diante das derrotas humilhantes, das eliminações difíceis e dos infinitos problemas internos do clube – que sempre nos afetam – nunca perdi as esperanças. Pensar em dias melhores é algo que faço sempre nos tempos difíceis, pois sei que a força do meu time não vem desse mundo.
Sinto-me feliz e abençoada a cada novo dia. O futebol se tornou algo muito especial para mim. Hoje sou Internacional e morrerei Internacional. Apesar de tudo, não me arrependo desse amor.
Jéssica Loures, a Guria das Gerais